Crítica: O Nome da Morte

Crítica: O Nome da Morte

Thriller baseado em história real propõe questionamentos sobre ética e moral

Imagem do filme 'O Nome da Morte'

Um pistoleiro, uma história de descobrimentos, dificuldades e o reflexo das influências familiares. Seria o fator “baseado em fatos reais” e o tempero brasileiro o suficiente para diferenciar e talvez enriquecer uma premissa tão pouco original dentro de um espaço limitado de possibilidades?

Os valores éticos questionáveis do protagonista e seu comportamento imoral denotam um problema sério existente no Brasil: o acesso escasso à educação, cultura e conhecimento. Muitos brasileiros são vítimas de uma baixa escolaridade, com evidentes dificuldades financeiras, e vivem em situações arriscadas. Com uma forte presença de princípios religiosos (na maioria cristãos), encontram no convívio familiar sua maior e única virtude. É interessante ver a maneira sutil como o primeiro ato do filme se constrói, apresentando esse lado honrado da família do protagonista, e sua gradativa aproximação ao universo do crime. Ainda assim, O Nome da Morte tem seus problemas.

O novo filme dirigido por Henrique Goldman é baseado no livro de Klester Cavalcanti, que por sua vez é baseado na vida de Júlio Santana (interpretado por Marco Pigossi), um pai de família, homem caridoso, exemplo para sua família e motivo de orgulho para os seus pais. No entanto, Júlio esconde outra identidade sob esta fachada: é um assassino profissional responsável por 492 mortes. Entre a cruz e a espada, entre a lei e o crime, ele precisa descobrir uma forma de enfrentar os seus demônios.

A história em si não me parece nova nem de longe. Mas a falta de originalidade não é o maior problema de um filme, acredito que a cada ano que passa percebemos mais isso. O defeito de fato preocupante de O Nome da Morte é a condução apática de seu enredo lento e previsível. São tapas que atingem o espectador nos momentos que o mesmo tenta se esforçar para se entrosar com a história e a motivação do protagonista, algo que não é muito bem elaborado. O vemos perder gradativamente sua piedade pelas vítimas ao longo do processo, mas não notamos ambição em seus olhos (o que teoricamente deveria mover Júlio a matar). Isso pode decorrer de uma insuficiência expressiva do ator, uma falha da direção de atores ou mesmo uma precária construção do personagem.

Imagem do filme 'O Nome da Morte'

Com excesso de personagens e cenas descartáveis, a história real de Júlio Santana se mostra cansativa. Enquanto seria muito mais interessante se apoiar no drama familiar e no sentimento de culpa presente no protagonista, a narrativa tenta forçar ao espectador a ideia de que matar é o único trabalho que Júlio é capaz de fazer, e como isso é muito mal vendido pelo filme, dificilmente é comprado pelo público.

Com todos seus problemas de coesão na estrutura da trama, as interpretações no thriller ainda são muito boas. Pigossi e Fabiula Nascimento (que interpreta Maria) possuem química em cena e e aos poucos convencem o público que as escolhas de seus personagens definiram a falta de perspectivas para o próprio casal. É preciso destacar mais uma gigante atuação de André Mattos, dessa vez como tio de Júlio. O ator ainda foi creditado como preparador de elenco de atores locais e não atores.

A direção de Henrique Goldman garante um apelo visual charmosíssimo, com uma tonalidade amarelada que é refletida através das lentes e filtros do diretor de fotografia Azul Serra e da paleta de cores e composição de cenário de Tiago Marques, o diretor de arte. Mas, ao mesmo tempo, Goldman perde a mão na hora de fazer a engrenagem de um roteiro problemático se mover junto com sua qualidade imagética. O Nome da Morte também não é tecnicamente perfeito. Seus cortes previsíveis e repetitivos e principalmente a trilha sonora antagônica (que muitas vezes não casa com a proposta das cenas) expõem uma irregularidade marcante na obra.

Se você é um espectador já farto de tiros e correria no cinema nacional, talvez esse filme realmente não seja pra você. Mas eu aconselho qualquer um a dar uma chance e conferir o longa que mistura elementos de ação, drama e suspense com traços de reflexões sociais. Entretanto, é necessário adentrar o cinema com a mentalidade de que é uma história real que busca espelhar as piores condições estruturais de nosso país, e não esperar por um ritmo frenético de roteiro.

Imagem do filme 'O Nome da Morte'

João Pedro Accinelli

Amante do cinema desde a infância, encontrou sua paixão pelo horror durante a adolescência e até hoje se considera um aventureiro dos subgêneros. Formado em Cinema e Audiovisual, é idealizador do CurtaBR e co-fundador da 2Copos Produções. Redator do Cinematecando desde 2016, e do RdM desde 2019.