A Viagem de Chihiro: Vale a pena assistir?
Qual o melhor filme para embarcar pela primeira vez na mente lúdica do respeitado diretor japonês Hayao Miyazaki? É difícil dizer, uma vez que o currículo do Studio Ghibli é de fazer inveja a qualquer outra produtora de animações. Para começar nossa série de posts, optamos pela obra mais premiada de Miyazaki: A Viagem de Chihiro, de 2001.
Ao todo, Sen to Chihiro no Kamikakushi (O Arrebatamento de Sen e Chihiro, no título original) ganhou trinta e cinco prêmios. Entre eles, o Urso de Ouro de 2002 e o Oscar de Melhor Animação de 2003, concorrendo com os ocidentais de peso, como Lilo & Stitch e A Era do Gelo.
Partindo da concepção do longa, no final dos anos 90, Miyazaki sentia que seu vasto portfólio ainda não havia atingido certos demográficos. Meu Amigo Totoro e Princesa Mononoke fizeram muito sucesso entre meninos e adolescentes, mas não chegaram a tocar o coração de meninas entre oito e doze anos com tanta precisão. Uma olhada rápida no que este público alvo consumia e Miyazaki concluiu que tratavam-se de histórias rasas sobre romances e namoros, temas recorrentes em mangás shoujo. O objetivo de Miyazaki era se distanciar das obras tradicionais, integrando valores importantes de convivência, como dedicação e amizade.
“Há um livro infantil japonês dos anos 80 chamado A Misteriosa Cidade Após a Neblina que comoveu um integrante da minha equipe. Na época, ainda estávamos trabalhando em Princesa Mononoke, em meados de 1996” disse Miyazaki. “Fiquei fascinado com a história, e escrevi uma proposta de roteiro baseada na obra. O projeto foi recusado, então trabalhei em outros roteiros até chegar na história definitiva de Chihiro.”
Chihiro Ogino é uma garotinha de dez anos que é obrigada a se mudar para uma nova cidade com seus pais. Por deixar sua zona de conforto, a Chihiro não esconde a insatisfação com a nova vida que lhe aguarda. Durante o trajeto, seu pai acaba errando o caminho, indo parar na frente de um túnel guardado pela estátua de uma criatura mística. Novamente contrariando as vontades da garota, os pais de Chihiro entram no túnel misterioso, iniciando uma trajetória fantástica no estilo Alice no País das Maravilhas. Em um mundo paralelo habitado por criaturas e entidades fantásticas do folclore japonês, Chihiro precisa se virar para reencontrar seus pais e retornar ao mundo dos humanos.
Com orçamento de US$ 15 milhões, Miyazaki e sua equipe começaram a trabalhar no longa em 2000, utilizando diversas técnicas de animação digital. Um dos tópicos mais elogiados em A Viagem de Chihiro é a utilização de cores para transparecer sensações. A luxuosa casa de banho da Bruxa Yubaba, por exemplo, possui cores vibrantes, abusando de tons quentes e visual carregado. Já a casa de sua irmã, em uma pequena ilha ao final de uma estação de trem, usufrui cores mais terrosas e aconchegantes.
Miyazaki aproveita o enredo para traçar diversas críticas sociais. Todos os funcionários da casa de banho de Yubaba procuram agradar o espírito Sem Rosto por sua habilidade de produzir ouro. Já o Deus do Rio aparece irreconhecível no estabelecimento por conta da poluição, e precisa da ajuda de Chihiro para ser purificado.
O NOSSO OLHAR
O filme também pode se mostrar muito difícil ao público ocidental. E este que vos fala pode dizer por experiência própria. Fui ao cinema em 2001, acompanhado da minha família. À época, com sete ou oito anos, muito interessado em tudo que remete à cultura japonesa. Tive que enfrentar o tédio em diversas partes do longa, não apenas por sua complexidade, mas pelo tom sensível e contemplativo. A cena em que Chihiro e o espírito Sem Rosto precisam pegar o trem, por exemplo, é longa, não possui diálogos e a trilha sonora é aconchegante. Isso é algo que faz parte da poesia do filme e da interpretação de Miyazaki sobre a jornada da garota. Dificilmente teríamos algo parecido em uma animação ocidental.
A maneira que Hayao Miyazaki conduz o espectador na viagem por sua mente lúdica traz grandes emoções e visita sensações antigas. Ao mesmo tempo, a bela trilha sonora completa com delicadeza o conjunto de uma obra recheada de valores e sensibilidade. É fácil se identificar com a situação de Chihiro, não importando a idade. Afinal, ninguém gosta de mudanças, sejam elas boas ou ruins. O simples fato de sair da zona de conforto pode nos conduzir ao medo, e Chihiro parte desse ponto no começo da história.
O SUCESSO FORA DO JAPÃO
A Viagem de Chihiro foi um sucesso comercial no Japão, sendo até hoje a maior bilheteria da história do país. Foram US$ 229 milhões ante os US$ 15 milhões de investimento. Foi também o primeiro filme a arrecadar mais de US$ 200 milhões a nível mundial antes de estrear nos Estados Unidos. O site Film School Rejects coloca o longa na lista dos 30 melhores filmes da última década, ao lado de Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças e Batman: O Cavaleiro das Trevas. Elvis Mitchell do The New York Times elogiou a qualidade da animação e a profundidade dos personagens. Já Kenneth Turan, do Los Angeles Times, diz que A Viagem de Chihiro é diferente de qualquer longa de animação já feito. Vale a pena assistir antes de embarcar nas outras obras do Studio Ghibli.
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