Crítica: 7 Dias em Entebbe

Crítica: 7 Dias em Entebbe

Novo filme de José Padilha apresenta roteiro salgado e recheado de inconveniências, mas é salvo por seus aspectos técnicos

Após uma mista e conturbada recepção de sua série da Netflix, O Mecanismo, José Padilha parece não fazer questão de fugir de produções polêmicas de conteúdo tendencioso. Ainda que o cineasta não assine o roteiro do filme, é clara sua participação e responsabilidade pela história que está contando através de imagens e sons. Juntamente à narrativa, é a visão do diretor o primeiro elemento que chega aos olhos do público, e portanto devemos apontar alguns problemas no enredo de 7 Dias em Entebbe que impedem o filme de ser algo vistoso aos olhos do mundo, pois tecnicamente o filme não deixa a desejar.

Baseado em fatos reais, o filme parte de julho de 1976, quando um voo da Air France de Tel-Aviv à Paris foi tomado por quatro sequestradores pró-Palestina e forçado a pousar em Entebbe, na Uganda. Os passageiros judeus foram mantidos reféns para ser negociada a liberação dos palestinos presos em Israel, na Alemanha e na Suécia. Sob pressão, o governo israelita decidiu organizar uma operação de resgate atacar o campo de pouso e soltar os reféns. No filme, toda essa história é contada ao espectador, mas a partir de uma visão potencialmente parcial, que, pelo menos no caso, coloca Israel como um povo sofredor e os palestinos como possíveis vilões.

A falta de imparcialidade do roteiro de Gregory Burke, faz com que o filme revele um olhar superficial sobre o conflito entre palestinos e judeus, que se estende há incontáveis décadas. É com certeza um dos assuntos que estão sempre em pauta, sendo abordado em jornais, televisão, e qualquer meio midiático. Por isso mesmo é importante que uma obra que se propõe se arriscar nesse contexto saiba mostrar as cicatrizes dos dois lados.

Seria inteligente iniciar e finalizar o filme sem se posicionar em relação ao conflito, algo que hora é feito por trás das cortinas (através de imagens) e hora escancaradamente (por meio de diálogos vergonhosos). O exemplo mais memorável dos 107 minutos de filme, é quando um engenheiro do avião diz a Wilfried Böse (Daniel Brühl), um dos sequestradores, que um engenheiro vale por 10 revolucionários. Fica claro a ausência de argumentação do engenheiro em seu ponto de vista vago e simplista, mas o que realmente reforça o posicionamento do roteiro em defesa do engenheiro, é a falta de palavras do personagem de Brühl diante da situação tão absurda, desconcertando qualquer espectador. A obra praticamente denigre a imagem de líderes revolucionários, ignorando sua importância frente a tantas conquistas mundiais durante o século XIX e XX.

Além dos diálogos preguiçosamente escritos e de toda colocação imparcial da história, causando problemas com a falta de um tratamento fiel e realista do conflito, o roteiro ainda não elabora a relação entre os personagens. Vemos conversas redundantes entre o primeiro ministro de Israel, Yitzhak Rabin (Lior Ashkenazi), e seu então auxiliar Shimon Peres (Eddie Marsan) que pouco acrescentam a trama, e ambos os atores se mostram pouco expressivos. O único acerto acaba sendo os personagens alemães de Daniel Brühl e Rosamund Pike (que interpreta Brigitte Kuhlmann) possuem uma boa química e se mostram revolucionários determinados, com objetivos claros, mas também preocupados com uma possível falha na missão, que resultaria na morte de ambos. Brühl e Pike se entregam á história de maneira sublime, passando veracidade aos sentimentos de seus personagens e convencendo o público.

Ainda assim, o filme sobre a Operação Entebbe (um dos episódios mais conhecidos da luta entre palestinos e israelenses), dirigido por um brasileiro e roteirizado por um escocês, vê-se diante de uma história complicada e cheia de pilares quebradiços, mas consegue envolver o espectador com um ritmo muito conciso da montagem e dos movimentos de câmera, além de uma boa ambientação da direção de arte que recria bem o ambiente caloroso de Uganda. A iluminação amarelada nos rostos dos personagens é muito conveniente para o clima do filme, se apoiando em uma paleta de tons escuros. Isso, junto aos enquadramentos, fazem da fotografia de Lula Carvalho o melhor elemento de 7 Dias em Entebbe.

A trilha musical composta por Rodrigo Amarante se faz apagada e mal aproveitada, e a soundtrack chega a ser repetitiva ao incluir a faixa “Echad Mi Yodeah” diversas vezes, inclusive em uma das cenas finais que finalmente evidencia o conflito armado, algo que não conversa com o ritmo da música, assim como o roteiro não conversa com o resto dos aspectos técnicos do filme. Definitivamente, este filme não é o melhor caminho para começar a entender a questão da Palestina e o conflito entre palestinos e judeus, mas é um bom entretenimento para entrar dentro de cenas angustiantes e se deixar levar por um divertimento cinematográfico.

https://www.youtube.com/watch?v=raJNjSSqHxc

FICHA TÉCNICA
Direção: José Padilha
Roteiro:
Gregory Burke
Elenco: Rosamund Pike, Daniel Brühl, Lior Ashkenazi, Mark Ivanir, Denis Ménochet, Eddie Marsan, Ben Schnetzer, Andrea Deck, Nonso Anozie
Produção: Tim Bevan, Liza Chasin, Eric Fellner, Ron Halpern, Kate Solomon, Michelle Wright
Fotografia: Lula Carvalho
Montagem: Daniel Rezende
Música: Rodrigo Amarante
Gênero:
Suspense / Drama
Duração: 107 min.

João Pedro Accinelli

Amante do cinema desde a infância, encontrou sua paixão pelo horror durante a adolescência e até hoje se considera um aventureiro dos subgêneros. Formado em Cinema e Audiovisual, é idealizador do CurtaBR e co-fundador da 2Copos Produções. Redator do Cinematecando desde 2016, e do RdM desde 2019.

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