Westworld é a série que precisávamos em 2016

Westworld é a série que precisávamos em 2016

Depois de várias decepções no mundo do cinema este ano, a nova série da HBO apresenta uma ficção científica de qualidade em 10 episódios 

Dois amigos, Peter Martin e John Blane, decidem passar as férias no hipermoderno centro de diversões da Delos. No local, a graça é duelar contra robôs que imitam com perfeição as características humanas, desde a fisionomia até os sentimentos e sensações. Essa é a premissa de Westworld – Onde Ninguém Tem Alma, dirigido por Michael Crichton em 1973 e que inspirou a nova série da HBO, Westworld. Mas, mesmo que as duas produções possuam o mesmo ponto de partida, o filme e a série mostram perspectivas diferentes, além de serem distintas em diversos momentos (na verdade, elas são distintas em quase tudo). Se você se decepcionou com grande parte dos lançamentos em 2016, não precisa ter medo de se jogar em Westworld. Em 10 episódios, a série é uma obra que vai deixar os fãs de ficção científica fascinados.

Nós já conhecemos Jonathan Nolan muito bem por filmes como O Cavaleiro das Trevas e Interestelar. E, ao lado de J. J. Abrams (responsável por Star Wars: O Despertar da Força) e Lisa Joy, a ideologia de Westworld: Onde Ninguém Tem Alma, foi expandida e disseminada de maneira surpreendente. O que vemos em Westworld é uma mistura muito bem feita de ficção científica, revolução das máquinas e filosofia. A série, que em diversos momentos é perturbadora, nos apresenta questionamentos importantes sobre os limites do ser humano e a linha tênue entre a sensação de poder e loucura.

Na série, Westworld é um parque criado por Robert Ford (Anthony Hopkins), que tem como tema o velho oeste. O lugar é povoado pelos anfitriões, robôs realistas que interagem com os visitantes que vão à Westworld para experimentar a sensação de fazer tudo o que jamais fariam no mundo real. No parque, os atos dos visitantes não possuem consequências e eles nunca perdem o jogo. É nesse ponto da série que percebemos o quanto essa sensação plena de poder leva as pessoas ao extremo de suas atitudes. O que vemos a todo o momento é um mar de violência: tiroteio, estupro, brigas, mas nada disso aparece na série de maneira gratuita. A violência está inserida em Westworld como uma forma de mostrar que é exatamente o caos que os visitantes procuram. O parque é um jeito de fazer as pessoas encontrarem a personalidade que elas escondem para viver em harmonia dentro da sociedade.

No início de Westworld, somos apresentados à Dolores (Evan Rachel Wood), uma das primeiras anfitriãs do parque e que vive a sua narrativa pacata de acordar, levantar, conversar com o pai fazendeiro e ir à cidade. É importante entender que a série traz vários núcleos que se unem e formam uma narrativa só: primeiro, existe a história do parque. E não pense que o Westworld é só um background para a série, ele é um personagem importante assim como os protagonistas da produção. Depois, cada um dos anfitriões possui a sua própria narrativa, que pode ser modificada a qualquer momento por seus criadores. Além disso, temos o núcleo de Ford e de toda a empresa que movimenta Westworld.

Toda essa história se passa em um futuro distante, já que a tecnologia é absurda. Imagine desenvolver robôs que imitam com perfeição o ser humano? Além da parte física, essas “máquinas” choram, sangram e são capazes de demonstrar amor, tristeza e empatia. Ou seja, é quase impossível distinguir quem, de fato, são pessoas de carne e osso dentro de Westworld. Vale reforçar que as armas utilizadas dentro do parque não ferem os visitantes, mas “matam” os anfitriões, que são concertados e logo devolvidos para a sua narrativa. No campo filosófico, o que a série propõe é, de certa forma, simples: se os robôs são tão realistas até na maneira de sentir, como conseguimos tortura-los? Como não sentimos culpa? Somos todos psicopatas quando é nos dado o poder da imortalidade?

Outro questionamento tem relação com a revolução das máquinas. Em Westworld, Ford sempre atualiza os anfitriões que cria para que eles cheguem cada dia mais próximos da realidade. Assim, ele desenvolve os “devaneios”, que acaba dando aos robôs uma espécie de consciência. Quando o pai de Dolores encontra uma foto e começa a notar que tem algo de errado com a sua existência, já percebemos qual o caminho que a história vai tomar. Alguns outros personagens seguem o mesmo rumo, como Dolores, que começa a se lembrar de memórias de atualizações passadas e sair de sua narrativa por conta própria. Ao lado dela, temos personagens importantes como Maeve, Bernard, Elsie e o Homem de Preto, que visita o parque com a finalidade de libertar os anfitriões.

A primeira temporada de Westworld possui 10 episódios com 58 minutos cada um e é transmitida pela HBO (também disponível no HBO GO). Se a preocupação da emissora era criar uma série tão grande quanto Game of Thrones, eles podem dormir tranquilos. Com muita ação e uma tonelada de mistérios, que são revelados de maneira inteligente ao longo da trama, Westworld já é querida por muitos – e com razão. A série foi renovada para a segunda temporada, prevista para chegar na HBO no fim de 2017 ou começo de 2018.

ENTENDA A ORDEM CRONOLÓGICA DE WESTWORLD

Depois do resumo da história de Westworld e alguns de seus personagens, é hora de falar sobre a ordem cronológica da série. Isso porque ela é contada completamente fora de ordem, o que acabou confundindo algumas pessoas. A verdade é que Westworld não possui três ou mais linhas do tempo. A história possui apenas uma linha, que é contada através dos flashbacks de Dolores todas as vezes que ela ouve a frase: “você se lembra?”. Eu deixei a explicação da ordem cronológica para o final por causa dos spoilers. É impossível falar sobre isso sem soltar algumas informações que podem comprometer a sua experiência na hora de assistir a série. A partir de agora, ler esse texto é por sua conta e risco.

35 anos atrás…

Esse é o momento da construção do parque, feito por Ford e seu sócio, Arnold. Nos flashbacks de Dolores, temos a informação de que ela e Arnold (que no início acreditamos se tratar de Bernard, já que ele é uma cópia fiel do sócio de Ford) se encontram escondidos em uma sala sob a igreja. Arnold lê histórias para Dolores, questiona sobre a sua existência e também pede que ela encontre o centro do labirinto para ser livre. A ideia do personagem, na verdade, é mostrar que os robôs são capazes de atingir a consciência, o que transformaria Westworld em uma atração perigosa e de trabalho escravo. Para isso, Arnold se sacrifica e pede que Dolores o mate para provar que ela é capaz de sair de sua narrativa por vontade própria. O plano não deu certo já que, mesmo após o acidente, o parque abriu depois de algumas modificações no sistema dos anfitriões e na segurança do parque.

30 anos atrás…

Após a morte de Arnold, somos apresentados a William e Logan, dois personagens fundamentais. Essa parte da história é uma das mais divertidas e que se conecta com a atualidade. Logan é um rapaz que só pensa em sexo e violência dentro de Westworld, enquanto William continua seguindo, até certo ponto, a sua pose de bonzinho. Eles conhecem Dolores, por quem William se apaixona e vê na anfitriã algo diferente. Descobrimos que Dolores escuta a voz de Arnold com frequência, sempre a levando para os lugares que ela e o seu criador se encontravam. Esse momento da história termina com a decepção de William depois de perder Dolores e notar que a memória da anfitriã foi apagada.

O presente…

A atualidade foca no Homem de Preto e na sua obsessão por descobrir o centro do labirinto. Além disso, tudo começa a acontecer: os anfitriões apresentam defeitos e param de obedecer alguns comandos. Destaque para a personagem Maeve e o personagem Hector, de Rodrigo Santoro. Ambos são incríveis e possuem uma química maravilhosa.

AFINAL, O QUE É O LABIRINTO?

Em um episódio, o próprio Arnold explica para Dolores o que é o centro do labirinto que ele faz questão que ela encontre por conta própria. Para ele, essa seria mais uma prova de que os anfitriões de Westworld estão realmente vivos, já que para encontrar o centro, Dolores teria que fugir da narrativa que criaram para ela. Para Dolores, encontrar o centro do labirinto garantiria a sua liberdade. O personagem explica que sempre acreditou que o caminho para a mente bicameral era uma pirâmide que você precisava “subir” para alcançar o nível mais alto de consciência. Com o tempo, Arnold descobriu que a busca pela consciência é como um labirinto e encontrar o centro transformaria Dolores em uma máquina com vontades e pensamentos próprios.

Jaquelini Cornachioni